17 de set. de 2013

uma boca eleita entre todas.

Toco a tua boca
Com um dedo toco a beira da tua boca,
Desenho-a como se me saísse da mão
Como se, pela primeira vez, a tua boca se entreabrisse
E basta-me fechar os olhos para desfazer tudo e recomeçar
Faço nascer uma vez mais a boca que desejo
A boca que a minha mão elege e que desenha na tua cara
Uma boca eleita entre todas, com soberana liberdade
Escolhida por mim, para desenhá-la com a minha mão na tua cara
E que, por um azar que não tento compreender,
Coincide exactamente com a tua boca que sorri debaixo da minha mão que a desenha

Olhas-me, olhas-me de perto, cada vez mais de perto, 
E então brincamos ao ciclope,
Olhamo-nos cada vez mais de perto e os nossos olhos aumentam
Procuram-se entre si, sobrepõem-se e os ciclopes olham-se
Respiram confusos, as bocas encontram-se e lutam calidamente
Mordendo-se com os lábios, apoiando apenas a língua nos dentes
Jogando nos seus cantos, onde um ar pesado vai e vem 
Com um perfume velho e um silêncio
Então as minhas mãos procuram fundir-se no teu cabelo,
Acariciar lentamente a profundidade do teu cabelo
Enquanto nos beijamos como se tivéssemos a boca cheia de flores ou peixes
De movimentos vivos, de fragrância obscura
E se nos mordermos a dor é doce,
E se nos demoramos num breve e terrível absorver simultâneo de fôlego,
Essa morte instantânea é bela.
E há uma só saliva e um só sabor a fruta madura,
E eu sinto-te tremer contra mim como uma lua na água.
  
(Tradução pessoal do espanhol)

La Rayuela, Julio Cortázar

27 de jun. de 2013

the darkest place

your mouth -,
oh my love, that mouth of yours -
as a place I cannot go,
a road I cannot travel.
I long for that rain to shower upon me,
I wish I could travel its paths,
unravel its secrets,
drown on its flavours.

such a dark place on human nature,
that mouth of yours is,
that enigmatic door that speaks for you.
I'd rest on its smoothness
until the end of time
for the sweetest licquors in life
lay upon that mouth.

Oh, I lost myself once
in the depths of your mouth
For an instant I held on to it
Hugged it as life itself
The bittersweetness of your mouth,
its warm walls and grounds,
and its sky...
a sky so full of stars
it blinded me for good.

21 de mar. de 2013

uma é pouco

uma morte vai ser pouca para ti, nesta vida.
porque te deu ela o poder de criar outras vidas?
porque persistes quando tantos perecem?
quando melhores se perdem em curvas e sufocares nocturnos?
porque não se te aperta o coração, como se apertam os dos que o têm?
porque me assombras a existência,
vivendo cegamente e alegremente
na sujidade da tua, no vazio da tua?
porque te perdoam todos e te ouvem os queixumes
quando jamais foste ombro para o que quer que seja?
porque não te vais?
o meu único grão de compreensão prende-se com a certeza
de que nem a morte te quer.

8 de fev. de 2013

ensaio sobre a angústia

o meu gatinho está doente. não quer comer, não quer brincar, tem febre e não responde a chamamentos para "a mesa". só quer é dormir...

*figas*

6 de jan. de 2013

to be or not to be

to be lovable,
or fuckable,
just ain't the same thing.

~

at times, we can all become the second,
but some people go through life never being the first.

3 de jan. de 2013

aqui, vindos de...?

Ultimamente pergunto-me o que é feito de nós. Sim, o que é feito do que fomos e do que nos ensinaram primeiramente na vida; da inocência, da crença, da confiança incondicional, dos valores base, da distinção do bem e do mal, da sensibilidade para percepcionar o outro, da pureza de espírito e até do altruísmo com que entregávamos o nosso último rebuçado à avó, quando ela o pedia para nos testar. 

Parece que tivemos todos um passado difícil; esqueletos no armário. Mas na realidade somos todos muito jovens, e os erros que vamos cometendo não evidenciam a pessoa (pior) em que nos tornaremos? Isto é, se aos vinte e três/... já chegámos a ponto tal que nada nos importa mas o nosso próprio estômago e conforto, o que será de nós aos quarenta? Por essa altura a vida já nos terá atropelado mais vinte vezes. Já teremos atropelado outros vinte vezes também e já teremos vencido, mas também perdido, outras também. E serão as perdas motivo para nos tornarmos piores? Vingar-se-á a vida de nós e nós, não nos podendo vingar nela, vingamo-nos dos outros? É que me parece que algumas pessoas vivem numa Cruzada constante para prejudicar outrem. Concluo que a vida deles não lhes basta e que as lições que deveriam estar a aprender estão a passar-lhes ao lado. A vida não é sobre sermos maltratados e respondermos na mesma moeda ou irmo-nos tornando "beras". A vida é sobre irmo-nos tornando sempre melhores, não importa o que nos aconteça. E aos poucos a realidade há-de suavizar ou de, ao menos, deixar de nos importar.

Jamais me desviei do meu caminho para ir plantar ervas daninhas na horta de outros. Jamais saí do meu itinerário A - B via C para garantir que alguém saía mal de alguma situação. E é por isto (e também porque não me submeto quando o mal recai sobre mim, mas também não o deixo minar-me o coração) que sei que a vida ser-me-á sempre melhor.

Não deixa de ser grave que não se tenha moral, nem decência, nem sequer amor-próprio, numa idade tão prematura. Quão má pode ter sido a nossa existência para que tudo isso nos tenha sido arrancados tão cedo? Ou será que são valores de que nunca, sequer, dispusemos?

Concluo afirmando, e vale o que vale, que a minha consciência está sempre tranquila e que me orgulho das tentações que me espicaçaram mas às quais, em nome de coisas maiores, dei as costas. Gosto de mim.

2 de jan. de 2013

2013

Pergunto-me quanto tempo demorará até que possa considerar que já não te conheço, que já não és a pessoa que conhecia melhor do que ninguém e melhor do que a ninguém.