9 de jan. de 2011

vida nova

é um ano novo, logo, acho que tenho direito à minha vida nova. não me iludo, sei que é tão provável ir quanto ficar, mas sei que se for o meu futuro será melhor e que, se ficar, não saberei o que fazer nem por onde começar. quero tanto, mas tanto, essa vida nova. quero dar-lhe ordem de partida, quero fugir a estas paredes, a estas pessoas e a esta rotina. quero saber quem sou sozinha. quero que, num desses dias que pesquiso em sites de imobiliárias, marque realmente uma entrevista e, um dia, receba a chave na mão. quero tanto o meu espaço - as minhas paredes, o meu tecto, o meu chão, como o descrevo. entretanto, como uma overdose de mon chéris, deus, hoje é o nono que como. desconfio que, se houvessem mais, mais comeria. é disso tudo que preciso, preciso de estar no meu espaço sem receio que descubram um número ridículo de embrulhos de bombons debaixo da minha almofada. preciso de dispôr taças com bombons em todo o lado para, quando me apetecer, estender a mão e comer. preciso de uma cozinha minha, limpa por mim, onde as pessoas franzam a testa e arqueiem as sobrancelhas e digam: tu é que mantens (?) isto assim, limpo? enquanto escrevo descubro o que já sabia: estou a deixar de saber escrever a minha língua com precisão. falar é uma coisa, oiço as palavras no ouvido, ecoam-me na cabeça, mas e escrevê-las? paro constantemente a verificar ortografias, vou ao tradutor ver se a palavra existe em português. as línguas estão a destruir o que sei da minha, e não sou a única a queixar-se disto. 
falava eu de uma vida nova... ainda hoje estava na paragem do metro e, como sempre, pus-me a imaginar que paisagens verei quando viajar, ao invés, nos transportes franceses. será que vou? pergunto-me, será que vou? quero tanto ir, mas levar tudo o que tenho aqui... amo demasiado estas pessoas, amo-as tanto que o encanto de Paris será vago perante o meu amor por elas. mas, de novo... o que farei eu aqui? pelo menos de momento, está fora de questão tentar ser guia, não tenho forças para uma batalha final. vou trabalhar para uma agência de viagens? um mestrado em Portugal está fora de questão, não aguentaria continuar a estudar neste contexto. talvez lá, sob o encanto da Torre Eiffel, consiga tirar um mestrado. talvez lá descubra o que quero da vida. entretanto imagino-me lá, imagino quem seria, imagino-me no seio da minha família negra, já lhes ouço as gargalhadas, já me vejo a falar francês com eles, não creio que demorasse muito a ambientar-me. já me vejo a viajar, a acompanhá-los nas viagens que sei que fazem, sobretudo ao luxemburgo e à bélgica. será que seria feliz lá? será que seria eu, lá? será que, lá, aprenderei a dar valor ao que desprezo aqui? será que aprenderei mais sobre o ser-se português nas terras da antiga Gália? será que encontrarei algum significado para a la marseillese? quero demais ser feliz. vejo-me a ler livros em francês, vejo-me a andar de bicicleta, vejo Paris a trazer-me para cima quando me sentir embaixo, enquanto este buraco luso em que me encontro só me puxa mais para baixo com perspectivas de cortes salariais a acontecerem a pessoas que convivem ombro a ombro comigo. este país está doido, quer afundar os cidadãos, e eu vou fugir antes que se lembre de mo proibir. não irei ao fundo com Portugal, irei ao fundo com saudades do seu sal. sal que sempre alimentou a minha vida. só que agora... quero uma nova.

2 comentários:

  1. Bonito o teu post!

    É muito importante saber quem se é sozinho... Já pensava nisto há tanto tempo, mas acho que nunca tinha conseguido traduzir esse sentimento em palavras. VAI!:)

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  2. Haha... e como te compreendo em relação às línguas!:p Estive algum tempo a estudar na Alemanha. Falava três línguas diariamente e português quase só ao telefone. Quando regressei a Pt e à universidade cá, sentia-me completamente embrutecida em termos linguísticos. Tinha receio de tratar de assuntos com professores, porque só me saia o vocabulário mais básico, mil e uma palavras vinham-me à cabeça em todas as línguas menos na minha... É triste, esta parte. Entretanto recuperei o meu português, e as outras línguas vão tendo (tristes) oscilações.

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