Hoje ocorreu-me, pela primeira vez, o significado do perdão cristão. Como guia espiritual de grande parte da população mundial, a igreja católica tem feito inúmeros sermões a salientar a nobreza de se perdoar alguém, à imagem de deus (imagino que durante os séculos XVI e XVIII em que a Inquisição andou por cá no activo isso não se aplicasse). Fizeram-me mal. Não fisicamente, não moralmente, não me ofenderam directamente. Mas fizeram-me mal, aos poucos e poucos, fizeram-me ter que guardar coisas que preferia que não tivessem existido. Foi como se me tivessem retalhado partes da personalidade que agora não tem solução possível. Hoje fui confrontada com uma das muitas hipóteses de perdão. Pediram-me ajuda monetária. Era um valor ínfimo, o equivalente a um café e era esse o fim. A vida é irónica, mas a vida faz sentido. Recusei, fiz um comentário desagradável e fiquei a ouvir portas a bater. É preciso ter-se força para não se perdoar, para nos mantermos no caminho das lições. Eu quero dar lições a quem as merece, sempre desprezei aqueles que são demasiado fracos para desempenharem o papel de «mau da fita» até ao fim. O vilão merece castigo, e os bons devem ser suficientemente firmes para lho aplicar. Entretanto, pensei no pouco dinheiro que era, no facto de poder vir a ouvir comentários relacionados com a minha avareza. Rio para mim mesma, não é avareza, chama-se bonecas, cadernos, gelados, vernizes de menina e livrinhos de histórias por tabaco. Chama-se lição. Peguei na mesma quantia e oferecia-a a uma pessoa que está na recta final da sua vida mas, certamente, entre as melhores que conheço. Diz-me que não é preciso, que posso precisar do dinheiro. Posso rir-me com ele: não, avô, não preciso do dinheiro, toma lá e vai beber a tua bica.
Acabei de expiar os meus erros, se é que os cometi neste assunto. Fiquei feliz a ver o meu avô sair, humilde como é, satisfeito e reconhecido como ele só fica. É, eu gosto de pessoas que dão significados às coisas, que metem a hipótese de os seus desejos e necessidades não serem supremos, e haver alguém cujos mesmos sejam ainda mais urgentes. Meu querido avô, podiam ter feito mais como tu.
Acabei de expiar os meus erros, se é que os cometi neste assunto. Fiquei feliz a ver o meu avô sair, humilde como é, satisfeito e reconhecido como ele só fica. É, eu gosto de pessoas que dão significados às coisas, que metem a hipótese de os seus desejos e necessidades não serem supremos, e haver alguém cujos mesmos sejam ainda mais urgentes. Meu querido avô, podiam ter feito mais como tu.
9 Maio 2010
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